Franquia: Contrato Empresarial ou de Consumo?
O maior problema que temos no Brasil em relação a franquias é a natureza do contrato.
Vamos lembrar que historicamente essa modalidade de negócios nasceu para atender às necessidades de crescimento/expansão da empresa franqueadora, que não conseguiria fazê-lo sem a chamada de "parceiros".
Mas qual a natureza desse contrato, de negócios ou de consumo?
Quando ainda tínhamos a ciência do Direito Comercial, chamávamos de Contratos Mercantis aqueles que, resumindo de forma grosseiríssima (e aqui estou praticamente rasgando meu diploma por escrever dessa maneira), tinham em seus pólos duas empresas com fins lucrativos, sendo geralmente uma fornecedora e outra distribuidora.
Com o advento do direito empresarial no código civil, e o conceito muito mais abrangente do termo "empresário", o contrato empresarial ganhou em escala.
Hoje, qualquer pessoa que tenha atividade economicamente organizada e que circula bens ou serviços é considerado um empresário.
No contrato de franquia a licença geralmente é concedida entre empresa e uma pessoa física, pelo seu caráter personalíssimo, e entre a empresa franqueadora e uma empresa constituída por aquela pessoa física.
Portanto, tem natureza empresarial.
Mas será que a finalidade social/empresarial é sempre presente, ou ele pode ser entre uma empresa e seu consumidor final, e portanto de consumo? Via de regra, trata-se de um contrato empresarial, onde uma empresa fornece serviços, produtos e/ou tecnologia para que a outra atenda o consumidor final utilizando a marca do fornecedor.
Mas é comum, diante de abusos de muitos franqueadores, que esse contrato perca a natureza "mercantil"/empresarial e torne-se um contrato de consumo.
No contrato de consumo, por sua vez, o produto ou serviço é entregue ao "consumidor final".
Exemplo simples para elucidar a questão: Franquia Dairy Queen nos EUA.
Nela, o franqueado atende o consumidor final, entregando seus deliciosos lanches, sorvetes, blizzards e etc. Já o franqueador atua somente na estratégia de marketing e no fornecimento dos produtos (hamburgueres, frangos, sorvetes e etc).
O franqueado tem com o seu público um contrato de CONSUMO, onde ele atende o final da cadeia de negócios jurídicos.
Já o franqueador tem com o franqueado um contrato empresarial de fornecimento.
Ocorre, porém, no Brasil, que muitas empresas são o que eu gosto de chamar de franquias "meu cliente é meu franqueado".
No exemplo citado acima, do Dairy Queen, o franqueado faz seus pedidos conforme a saída dos produtos na loja. Produtos que não saem ele não refaz o pedido e ainda tem o direito de "reclamar" ao franqueador medidas que o ajudem a desaguá-los.
O franqueador reconhece que o know-how e a aceitação dos seus produtos pelo consumidor final também depende dele e compreende que só poderá vender um produto se ele for aceito pelo consumidor final. Por isso respeita a natureza de seu contrato e não coloca o franqueado em saia justa.
Vejo, muitíssimas vezes, no Brasil, uma inversão total da ordem contratual, da natureza contratual.
É comum no Brasil o franqueador esquecer que seu produto precisa ser aceito, mas mesmo assim obriga o franqueado a adquiri-los.
Se o consumidor final não tem a intenção de consumir o produto ou serviço disponibilizado, e ainda assim o franqueado é obrigado a efetuar compras, isso demonstra que o franqueador enxerga o franqueado como seu consumidor final.
Quando isso acontece, há uma mudança na natureza contratual, o que muda completamente a regra do jogo, pois passará a ser um contrato com natureza consumeirista.
No campo do direito do consumidor, o consumidor tem muitos direitos que não são resguardados na relação mercantil.
É justamente aí que grandes empresas de franquias já perderam milhões de dólares.
Claro, que esse é um simples esboço de todo um universo contratual, incluído em um universo de leis, e que não é tão simples como descrevi. Mas a ideia básica está aí! Se você é franqueado e se sente consumidor, grite! Você deve ser ouvido como um consumidor.