A dificuldade dos franqueados, na relação com suas franquias.
Faz tempo que não escrevo aqui. Afinal de contas, o tempo tem ficado cada vez mais escasso com a quantidade de atendimentos, contratos e negociações.
Bom, hoje vamos refletir sobre um tema um pouco diferente: a dificuldade dos franqueados perante a justiça.
A letra fria da lei nem sempre consegue prever as nuances de um relacionamento contratual. Lembrando que o contrato de franquia pode ser comparado ao casamento, pois há, de fato, um relacionamento muito próximo entre franqueadores e franqueados.
Mas os tribunais brasileiros ainda não têm subterfúgios suficientes para compreender essa relação. Isso se dá porque muitas das franquias transparentes e corretas não têm tantas demandas judiciais.
E é justamente analisando essas franquias mais maduras que percebemos que todas as obrigações contratuais, de ambas as partes, são documentadas.
São relatórios de visitas, de vistoria, de reclamações e de treinamentos. São chamados abertos e respondidos em prazo condizente, através de sistema próprio. São recibos de serviços prestados pelo franqueador, como treinamentos e cursos administrados em favor da rede de franqueados.
Portanto, quando observamos essas redes que são verdadeiramente empenhadas em ajudar os seus franqueados, é que percebemos que para cada ação do franqueador, há um documento condizente.
Isso facilita muito quando, diante de um impasse entre franqueador e franqueado, é necessário levar o problema à justiça. Afinal, há evidências.
E o "X" da questão, tratando desse assunto, é que os tribunais não compreendem, ainda, esses procedimentos forjados por franquias maduras, no Brasil e no exterior.
O juiz de direito acaba julgando o processo de acordo com as regras gerais dos contratos, esquecendo dessa relação continuada entre as partes e da prestação de serviços que o franqueador oferece ao franqueado.
Essa falta de "experiência" dos tribunais em relação à vida prática das franquias tende a acabar conforme os processos chegam aos tribunais e esses prolatam suas decisões. Mas, analisando a jurisprudência atual, vemos que há uma distância abismódica entre a realidade que aflige os franqueados e a compreensão dos detalhes desse relacionamento tão peculiar, tanto nas sentenças quanto nas decisões colegiadas.
Um exemplo disso é a aplicação do princípio da "autonomia da vontade" como fundamentação para a "escolha" do franqueado em se sujeitar a um determinado tratamento da franqueadora que fora "superficialmente descrito" na COF ou no contrato.
Trocando em miúdos, vemos COFs e contratos que preveem, por exemplo, o auxílio do franqueador na escolha do ponto.
E como é feito esse auxílio, pelas boas franquias do país?
Simples. Há um serviço prestado pelo FRANQUEADOR para que as chances de sucesso em sua empreitada sejam maiores. Serviços como:
a) pesquisa em sites de geolocalização por faixa etária, classe social e etc;
b) contagem de carros e transeuntes;
c) mapeamento do comércio local e do público local;
d)levantamento dos concorrentes da região;
e) levantamento do preço dos concorrentes da região;
f) visita "in loco", e
g) projeto arquitetônico.
O franqueador, diante das informações levantadas ele "aprova" o ponto comercial, escolhendo o local cujas chances de sucesso sejam maiores.
E como, na prática, ocorre com as franquias menos sérias? Ora, elas querem simplesmente vender. Então, a aprovação é feita apenas através do envio de uma foto da frontispício do imóvel. Nada mais.
Mas a expectativa do FRANQUEADO, ao adquirir uma franquia, não é essa. Ele quer a "redução significativa dos seus riscos" e, por isso, paga a mais por uma franquia.
E é justamente aí, nessa falta de detalhamento da COF, que é comum vermos a justiça aplicar "autonomia da vontade privada" de maneira errada, pois justifica que a simples aprovação do ponto pelo franqueador, sem que houvesse qualquer pesquisa que fundamentasse a escolha do endereço comercial, era a vontade das partes. E a simples aprovação consuma as obrigações do franqueador quanto a esse quesito.
Mas a verdadeira "vontade" que compele o franqueado é o sucesso, e, portanto, o franqueador deve prestar os serviços para que esse objetivo fique mais tangível.
E a justiça deve compreender que as obrigações do franqueador não são meras formalidades e que o franqueado se sujeitou a elas e está preso pelo princípio da "vontade" exprimida. Na verdade, o franqueado desconhece esses erros e vícios gerenciais que assolam a maioria das franquias do Brasil.
E justamente, por não se tratarem de erros jurídicos de forma ou de vontade, mas por se tratarem de erros gerenciais que frustram as expectativas dos franqueados, é que torna-se difícil, para o judiciário, a compreensão das expectativas e das vontades expressadas em contrato.
É muito comum, após a assinatura do contrato de franquia, ouvirmos do franqueado algo do tipo: "mas é só isso?". Porque a expectativa é de um serviço de qualidade por parte do franqueador e que exprima de fato o seu "know-how" sobre o assunto.